Hasse, um rapaz alto, moreno, que era cinco anos mais velho do que eu, tinha o hábito de me atirar ao chão em todos os intervalos das aulas, durante o primeiro ano lectivo. No início, eu resistia ferozmente, mas não servia de nada, porque ele conseguia sempre deitar-me ao chão e ganhar. Por fim, descobri o método de o desiludir: descontração total. Quando ele se aproximava, eu fazia de conta que o Meu Eu tinha voado para outro sítio e deixado ali um cadáver, um trapo sem vida que ele podia deitar ao chão à vontade. Acabou por se fartar.
Penso no que este método, de uma pessoa se transformar num trapo sem vida, terá significado para mim ao longo da vida. A arte de ser pisado conservando a dignidade. Não terei recorrido a este método com demasiada frequência? Umas vezes resulta, outras não.
Thomas Transtromer, As Minhas Lembranças Observam-me, Sextante Editora, 2012 (tradução do sueco de Ana Diniz)
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Engraçado. Confesso-me por vezes fascinado, nas minhas leituras, por partes do texto que leio. Quando isso acontece, transcrevo-as para as minhas Notas (do Facebook...), não sem nunca procurar primeiro se já estão escritas na net, para me facilitar o trabalho (não sei se sou eu que estou cada vez mais preguiçoso ou se esse é mais um dos hábitos dos novos tempos). Encontrá-las não deixa de me deixar satisfeito: afinal, elas não me marcaram só a mim :-). Grato, por isso, pela partilha e um pedido de desculpas pelo "roubo"... João Vinagre
ResponderEliminar