CANTO NONO

Terá chovido durante cem dias e a água infiltrada
pelas raízes das ervas
chegou à biblioteca banhando as palavras santas
guardadas no convento.

Sajat-Novà o frade mais jovem
levou os livros todos por uma escada até ao telhado
e abriu-os aos sol para que o ar quente
enxugasse o papel molhado.

Um mês de boa estação passou
e o frade de joelhos no claustro
esperava dos livros um sinal de vida.
Uma manhã finalmente as páginas começaram
a ondular ligeiras no sopro do vento
parecia que tinha chegado um enxame aos telhados
e ele chorava porque os livros falavam.

Tonino Guerra, in O MEL, Assírio & Alvim, 2003 (tradução de Mário Rui de Oliveira)

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