II.

Bom é corromper o silêncio das palavras.
Como seja:

1. Uma rã me pedra. (A rã me corrompeu
para pedra. Retirou meus limites de ser humano
e me ampliou para coisa. A rã se tornou
o sujeito pessoal da frase e me largou no
chão a criar musgos para tapete de insetos
e de frades)

2.Um passarinho me árvore. (O passarinho me
transgrediu para árvore. Deixou-nos aos
ventos e às chuvas. Ele mesmo me bosteia
de dia e me desperta nas manhãs)

3. Os jardins se borboletam. (Significa que
os jardins se esvaziaram de suas sépalas
e de suas pétalas? Significa que os jardins
se abrem agora de um só buliço das
borboletas?)

4. Folham secas me outonam. (Folhas secas que
forram o chão das tardes me transmudaram
para outono? Eu sou meu outono.)

Gosto de viajar por palavras do que de trem.



Manoel de Barros, in Retrato do Artista Quando Coisa, Editora Record, 2009

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