Estava deitado e tinha os olhos fechados. E havia alturas, dias  menos movimentados, por assim dizer, em que essa posição era perfeitamente suportável. E foi então que se lembrou de usar os poemas. Ninguém seria capaz de acreditar como isso ajudava. Quando se ia dizendo assim lentamente um poema, com a entoação cadenciada das rimas finais, então havia de certo modo algo estável para o qual se podia olhar, interiormente, entenda-se. Mas ele sempre se interessara de modo especial pela literatura. Não se lamentava do seu estado, garantia-me o estudante que o conhecia havia muito. Só que com o tempo se desenvolvera dentro dele uma admiração excessiva por aqueles que, como o estudante, andavam lá fora e suportavam o movimento da Terra.


Rainer Maria Rilke, As Anotações de Malte Laurids Brigge, Relógio d' Água, 2003, or. 1910 (tradução de Maria Teresa Dias Furtado)

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