Degradação

Quem se enaltecer será rebaixado
assim que se olhar ao espelho,
assim que a velhice o incapacitar,
assim que contiver a respiração
na esperança de que a dor não voltará.

É inesgotável a pluralidade dos deserdados
e dos demais mortais
que parecem aguentar a sua degradação com maior humildade:
o falcão já não assaz rápido para alcançar o pombo,
a cegonha coxa escorraçada pelo bando em retirada.
O ciclo das estações, a descida à terra.

E os poderes celestiais? O que fazem?
Passeiam-se, olham. -Nós aqui, e acolá o chamado Reino da Natureza.
O que é pior? A consciência ou a falta dela?
Pois bem, no Paraíso não havia espelhos.

(2003)

Czeslaw Milosz, in Alguns Gostam de Poesia, Cavalo de Ferro, 2004 (tradução de Elzbieta Milewska e Sérgio das Neves)

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