Ela não via ausência em nada. Buraco ou morte, falta ou dor, palavras que podiam continuar a existir, mas não respiravam. Discreta asfixia derramada sobre o mundo. Os mesmos lugares, contaminados pela novidade de tão urgente reconfiguração da semântica. Sentidos, todos num feliz ao contrário. Não passou muito tempo e as frases fizeram-se seculares, ciência secreta entre duas idades indefinidas. As frases saíam das bocas desembarcadas ali. Ali, em corpos tão excitados como serenos - uma aberração erótica. Certo dia, ela enterneceu-se com pequenas naturezas mortas: sapatos descalçados, uma camisa branca pendurada no armário, um casaco pousado na cadeira. Nestes seres sem vida, que guardavam a passagem óbvia de alguém que nunca deixou de a escandalizar, provava-se a ausência do nada. Ele estava ali. Até que os sapatos, a camisa, o casaco começaram a esperar. Esperaram e esperaram e esperaram. Ninguém voltou. Só as palavras vulgares, exactamente coincidentes com o mundo, cheio de nada.
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